MONANGAMBA
Naquela roça grande não tem chuva
É o suor do meu rosto que rega as plantações;
Naquela roça grande tem café maduro
e aquele vermelho-cereja
são gotas do meu sangue feitas seiva.
O café vai ser torrado,
pisado, torturado,
vai ficar negro, negro da cor do contratado
Negro da cor do contratado!
Perguntem às aves que cantam,
aos regatos de alegre serpentear
e ao vento forte do sertão:
Quem se levanta cedo? quem vai à tonga?
Quem traz pela estrada longa
a tipóia ou o cacho de dendém?
Quem capina e em paga recebe desdém
fuba podre, peixe podre,
panos ruins, cinquenta angolares
"porrada se refilares"?
Quem?
Quem faz o milho crescer
e os laranjais florescer
— Quem?
Quem dá dinheiro para o patrão comprar
máquinas, carros, senhoras
e cabeças de pretos para os motores?
Quem faz o branco prosperar,
ter barriga grande - ter dinheiro?
— Quem?
E as aves que cantam,
os regatos de alegre serpentear
e o vento forte do sertão
responderão:
— "Monangambééé..."
Ah! Deixem-me ao menos subir às palmeiras
Deixem-me beber marufo, marufo
e esquecer diluído nas minhas bebedeiras
— "Monangambééé..."
António Jacinto [Golungo Alto, 1924- Luanda,1991], Poemas,
Casa dos Estudantes do Império, Lisboa, 1961
Monangamba – carregador, criado;
tonga – horta, quintal;
dedem – fruto de palmeira;
fuba – farinha da raiz de mandioca;
marufo – vinho da palmeira.
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